Folha Dirigida  -  Educação  -  pg. 06  -   10/7
Projeto de cotas para federais agora depende só dos deputados
Roberta Ribeiro

Com a aprovação do Senado, o projeto de lei 546/07, que implanta o sistema de cotas em universidades e escolas técnicas do governo federal, segue para votação na Câmara dos Deputados. A expectativa de aprovação do projeto gera opiniões divergentes no meio educacional. Muitos são os argumentos favoráveis à implantação do projeto, contudo, alguns educadores alertam para possíveis falhas na íntegra da lei.

Na opinião de Cícero Rodrigues, representante do Ministério da Educação (MEC) na cidade, o projeto de lei foi feito de uma forma interessante: "Se observarmos a Constituição Federal, existem artigos que tratam da igualdade no acesso à escola e, que todas as pessoas devem ter educação de qualidade. É preciso que as pessoas cheguem na universidade com igualdade e capacidade de competir. Para isso, a educação de base é fundamental".

Para a professora de Serviço Social da Uerj, Magali da Silva Almeida, o governo poderia ter atuado de outro modo. "Fazemos políticas de cotas e reservas, para promover o estudo dos desiguais. Mais uma vez o governo federal não enfrenta o que se comprometeu, que era combater o racismo". A crítica de Magali, que também coordena o Programa de estudos e debates dos povos africanos e afro-americanos, tem origem no fato de que nem sempre os alunos de escolas públicas são oriundos de uma classe social carente.  

"Entendendo a rede pública como um todo, os alunos dos Colégios de Aplicação, do Pedro II, por exemplo, que podem concorrer às vagas das cotas, não são necessariamente a população pobre. Quando falamos de ações afirmativas, falamos de grupos historicamente excluídos. Ainda há no Brasil uma pressão muito forte das elites para que isso não mude".

Educação de base com qualidade como a melhor maneira de nivelar as desigualdades é no que também acredita Magali. "Algumas vagas das cotas ficaram ociosas por conta de não termos ainda qualidade no ensino médio. Há um funil no ensino médio que exclui muito mais a população negra", explica. Para a professora, o centro da questão não é a pobreza, mas sim o racismo.

Segundo Cícero, o projeto vem acompanhado e precedido de três medidas importantes: o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), o Reuni, que pretende aumentar as matrículas nas federais e ainda a Universidade Aberta (UAB), que vai gerar 350 mil vagas.

"As pessoas acham que serão prejudicadas, mas digo que não serão, pois estamos implantando novas vagas nas universidade. Em dois ou  três anos a realidade já será diferente. Uma educação livre, justa e solidária, é o que queremos. Então, a sociedade deve ser mais solidária. Esse grupo é composto por pessoas tradicionalmente excluídas do ensino superior", argumenta Cícero.

Com relação aos problemas do ensino básico, o representante do MEC contou que a deficiência que existe na base de formação dos estudantes vem sendo trabalhada pelo governo com o PDE e  que até 2021 serão desenvolvidas ações para o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), que na última verificação ficou em 3,8%.

"A solução é melhorar a educação básica para que todos tenham igualdade desde o início e depois consigam entrar na universidade de maneira igualitária. Com a ajuda da sociedade conseguiremos mudar esse quadro. Todos os brasileiros devem ter acesso ao ensino e, não apenas os mais abastados", finaliza.


Para Educafro, luta agora é por assistência 

Luís Gustavo de Almeida

Não adianta aprovar o projeto de cotas sem ter uma assistência estudantil apropriada. É essa a afirmação que as entidades ligadas a eqüidade social tem sobre o projeto de cotas que tramita na Câmara. A ONG Educafro, a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes) e a União Nacional dos Estudantes (UNE) acreditam que a reserva de vagas deve estar vinculada a uma maior política de assistência ao cotista.

Frei Valnei Brunetto, diretor executivo da Educafro de São Paulo, garante que o sistema de reserva de vagas é algo a mais na questão de inclusão e defende que as ações afirmativas não devem ser reduzidas a cotas.

"A lei de cotas está amadurecendo, principalmente nas casas do poder. É necessária uma política de afirmação na educação. Vale ressaltar que as cotas são um mecanismo a mais. Elas fazem parte do âmbito das políticas públicas", analisa Frei Valnei.

Segundo o frei, a Educafro de São Paulo está criando e desenvolvendo um projeto para oferecer bolsa permanência, além da estudantil, para 300 alunos, em parceria com a Petrobrás. "Se pensar só em garantir a bolsa de estudos, não resolve. Mesmo um aluno recebendo auxílio integral, ele não se mantêm porque muitas vezes está desempregado. E, bem ou mal, tem que desembolsar uns 200 reais por mês".

Ele explica que, nesse projeto com a Petrobrás, que se encontra em fase de implantação, o valor do auxílio didático e o da alimentação será o mesmo para todos, mas o do transporte irá variar de pessoa para pessoa. "Depende de onde o aluno vai sair".

"A idéia é de dar vales, refeição e transporte, por exemplo, para facilitar a fiscalização. Mas ainda estamos estudando algumas questões. Nosso coordenador administrativo está trabalhando nisso com os gestores da Petrobrás", afirmou frei Valnei.

Gustavo Santana, diretor do combate ao racismo da UNE e cotista da Uerj, acredita que o sistema de cotas na universidade é uma forma de distribuição de renda no Brasil. Para ele, possuir um diploma neste país significa ascender profissionalmente. Por isso, o estudante da Uerj defende a reserva de vagas em concomitância de uma assistência ao universitário. "A lei 7399 que está tramitando na Câmara não é nada sem assistência. Elas têm que andar juntas".

Gustavo lembra que já foi aprovado pelo governador Sérgio Cabral um projeto que oferece bolsa de estudos aos cotistas até o final do curso, porém "o valor da bolsa é muito baixo". Segundo ele, esse valor foi reajustado mas ainda não é suficiente. "A quantia oferecida aos novos cotistas ainda não é o que precisamos para nos mantermos na universidade, mas já é um avanço considerado".

De acordo com Osvaldo Lemos, diretor de relações internacionais da Ubes, a aprovação do projeto no Senado é uma grande vitória do movimento estudantil mas ainda precisa ser melhorado.

"Nós da Ubes sempre defendemos o projeto de reservar vagas para alunos de escolas públicas, pois isso visa, de fato, a democratizar a universidade, mas ainda temos muito o que avançar. Esse projeto precisa estar conectado a um projeto de assistência estudantil forte para que o universitário permaneça na instituição".

Osvaldo esclarece que já foi aprovado, no governo Lula, um projeto de assistência estudantil, mas que precisa ser incrementado e ampliado. Segundo ele, o governo irá liberar uma verba de R$120 milhões que será distribuída entre 80 mil bolsas.

"Essa quantia ainda não é o valor que consegue cumprir com a realidade de dimensão de bolsistas mais carentes. É uma finalização positiva mas que não deve parar por aí. Precisamos sempre buscar mais verbas para a universidade. Tem que ser mais do que isso, com certeza., finaliza o dirigente.


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