O Globo  -  Rio  -  pg. 21  -   17/8
Projeto de cotas para acesso a escolas de oficiais provoca polêmica
Daniel Engelbrecht

Opositores argumentam que ingresso tem caráter de concurso público

A proposta de criação de um sistema de cotas para ingresso nos cursos de formação de oficiais da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros — o que representaria, na prática, a instituição da reserva de vagas no serviço público — voltou a receber críticas ontem. O secretário estadual de Saúde e Defesa Civil, Sérgio Côrtes, a quem o Corpo de Bombeiros está subordinado, disse que o ingresso na corporação tem natureza de concurso público, não podendo ser comparado aos vestibulares das universidades estaduais. Já o prefeito Cesar Maia acha que o correto seria verificar o percentual de negros existente atualmente na PM e no Corpo de Bombeiros: — Se for maior que a proporção na população, veremos se tratar de mero discurso em ano pré-eleitoral.

O projeto de lei, que estende às escolas de Formação de Oficiais da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros o mesmo sistema de cotas aplicado nas universidades estaduais, foi aprovado em primeira discussão na Alerj anteontem. Caso seja aprovado em nova votação, 45% das vagas nas duas instituições serão destinadas a estudantes da rede pública (20%), negros (20%) e deficientes físicos, representantes de minorias étnicas e filhos de policiais, agentes penitenciários e bombeiros mortos em serviço (5%).

Contrasenso: na PM, deficientes são reformados Opositores da proposta argumentam que o acesso às duas instituições, embora seja feito por meio do vestibular unificado da Uerj, tem caráter de concurso público, uma vez que os cadetes recebem remuneração e, aprovados no curso de formação, ingressam nos quadros do Corpo de Bombeiros e da PM como oficiais. Já nos cursos comuns de graduação, não há garantia de emprego nem remuneração para os estudantes.

Para o presidente da Associação dos Ativos, Inativos e Pensionistas das Polícias Militares, Brigadas Militares e Corpos de Bombeiros Militares do Brasil (Assinap), Miguel Cordeiro, o projeto é inconstitucional: — Nas universidades, as cotas foram criadas com o objetivo de dar uma oportunidade de estudo para os menos favorecidos.

Já nas escolas de formação de oficiais não se fala em aprendizado unicamente, mas em emprego, e para isso deve-se ter capacidade.

Cordeiro aponta ainda um contrasenso no projeto de lei, ao prever o ingresso de deficientes na Polícia Militar e no Corpo de Bombeiros: — Na PM, um deficiente é obrigado a se reformar. Como vai se permitir agora o ingresso deles na corporação? Mas a proposta também encontra defensores. O presidente do Centro de Articulação de Populações Marginalizadas (Ceap), Ivanir dos Santos, afirma que a sociedade brasileira tem a obrigação de fazer reparações por conta dos três séculos e meio de escravidão: — Na história da PM, só tivemos três comandantes negros.

Ele prevê que os sistemas de cotas em breve chegarão aos concursos públicos de outras áreas.


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