O Globo  -  O País  -  pg. 12  -   30/5
Para UnB, um gêmeo é negro e o outro, não
Demétrio Weber

Irmãos tentaram vestibular por sistema de cotas, e, embora iguais, um foi considerado branco após análise de fotos

BRASÍLIA. Primeira universidade federal a reservar vagas para negros, a Universidade de Brasília (UnB) vive um impasse. Os irmãos gêmeos Alex e Alan Teixeira da Cunha, de 18 anos, decidiram fazer o vestibular pelo sistema de cotas. Mas só a inscrição de Alan foi aceita. Para a banca encarregada de analisar fotos dos candidatos e decidir quem pode disputar vaga como cotista, Alex não é negro.

A decisão surpreendeu a família. Filhos de pai negro e mãe branca, Alan e Alex são gêmeos univitelinos, isso é, foram gerados a partir do mesmo óvulo. Eles contam que é comum serem confundidos. Alex quer fazer vestibular para nutrição e recorreu contra a decisão da banca. O resultado deverá sair até a próxima quarta-feira.

— Por que consideraram meu irmão negro e eu não? Não dá para saber quais são os critérios da UnB — diz Alex.

Este será o terceiro vestibular de Alex e Alan. Eles dizem que foram reprovados duas vezes e se inscreveram no sistema de cotas porque a nota de corte é mais baixa.

Alan, que pretende cursar educação física, é contra a reserva de vagas para negros. Ele acha que o critério deveria ser socioeconômico:

— Cor não significa nada, tudo depende da cabeça da pessoa. A cota deveria ser para a classe social mais baixa.

O pai dos gêmeos, Ronaldo Teixeira, é gerente do Banco do Brasil. A mãe é dona-de-casa. A família mora numa casa no Cruzeiro Velho, bairro de classe média em Brasília. Eles estudaram no Colégio Dom Bosco, uma escola particular, e fazem cursinho pré-vestibular também pago.

Alex não se recorda de episódio em que tenha sido vítima de racismo. Alan conta que sempre foi alvo de “brincadeiras”, como ser chamado de “preto” e “neguinho”.

Ele também já viu um amigo ser discriminado.

— Tem negro que é escuro, tem negro que é mais claro um pouco. Acho que sou negro. Não como ele (o amigo), mas negro também.

Desde 2004, a UnB reserva 20% das vagas dos cursos de graduação para estudantes que se declarem negros, independentemente da renda familiar ou de terem freqüentado escola pública ou particular. A análise das fotos visa a evitar fraudes. A UnB informou que o processo de inscrição no vestibular não está encerrado e que os recursos serão julgados. As provas serão em junho.


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