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O incrível valor do investimento em educação
artigo de Ethevaldo Siqueira

Faturamento da Embraer de apenas um ano corresponde ao orçamento de 102 anos do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA)

Ethevaldo Siqueira é jornalista especializado em tecnologias de informação e telecomunicações. Artigo publicado em sua coluna dominical em “O Estado de SP”:

Não é fácil quantificar o retorno do investimento em educação e tecnologia. Mas há alguns números tão significativos que valem mais do que qualquer discurso.

Como brasileiro, gostaria muito que todos os governantes e políticos considerassem um dado extremamente significativo: o faturamento da Embraer de apenas um ano corresponde ao orçamento de 102 anos do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA).

Estamos diante de fatos que não deixam dúvida, leitor.

Foi Ozires Silva, um dos criadores da Embraer, quem me deu essa informação. Ele ainda comenta: 'Eis aí um exemplo concreto e irrefutável do real valor agregado proporcionado pela educação'.

Qualquer estudioso do problema sabe que sem a criação do ITA há mais de 50 anos – e a conseqüente geração de competência brasileira nessa área – não teríamos hoje a Embraer, padrão de excelência mundial numa área de tecnologia de ponta.

Vale lembrar que o ITA e o Centro Técnico Aeroespacial (CTA) só nasceram graças à pertinácia de um grupo de brasileiros liderado pelo brigadeiro Casimiro Montenegro Filho.

Pense, agora, leitor, no que seria nossa agropecuária sem o trabalho de 33 anos da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).

O grande risco por que passa hoje essa empresa é trocar seus dirigentes, pesquisadores e profissionais competentes por companheiros indicados pelo PT.

Em matéria de educação e tecnologia, no entanto, o País tem sido um oceano de mediocridade e de carências, com alguns picos de excelência. Não me lembro do autor dessa frase, mas ela reflete bem a realidade.

Todas essas instituições de alto nível comprovam de forma cabal o valor dos investimentos de longo prazo em educação e tecnologia.

É claro que, além do ITA e da Embrapa, existem no Brasil diversas outras áreas de excelência. Mas em quantidade muito aquém das necessidades do país. Que seria do Brasil sem a USP, a Unicamp, a Escola Superior de Agronomia Luiz de Queirós (Esalq), o Instituto do Coração (Incor), o Instituto de Pesquisas Tecnológicas, a Escola Politécnica da USP e seu Laboratório de Sistemas Integráveis, os laboratórios de pesquisa da Petrobrás, da Marinha e do Exército?

Como regra geral, o maior mérito pela criação de projetos de excelência em educação no Brasil não pertence a nenhum presidente da República, nem ao Congresso e nem aos políticos.

A educação, a ciência e a tecnologia se desenvolvem no país apesar da negligência governamental.

Os poucos picos de excelência de que nos orgulhamos são o resultado da luta e do idealismo de alguns líderes e suas equipes anônimas.

A título de exemplificação, refiro-me a brasileiros como Osvaldo Cruz, Vital Brazil, Anísio Teixeira, Armando de Salles Oliveira, Júlio de Mesquita Filho, Casimiro Montenegro Filho, Zeferino Vaz, o comandante José Luiz Guaranys e tantos outros.

São líderes como esses, apoiados por educadores e pesquisadores, que, em última instância, lutaram até contra a indiferença ou a hostilidade governamental diante dos grandes projetos de longo prazo.

A propaganda oficial, no entanto, se apropria das vitórias, com fins eleitoreiros e populistas, desde as soluções baseadas em combustíveis renováveis – como o etanol ou o biodiesel – até à própria auto-suficiência do petróleo, obtida depois de 50 anos de muito trabalho, acertos e desacertos da Petrobrás.

Estamos cansados de discursos vazios e hipócritas sobre a importância da educação. Todos os presidentes da República nos últimos 50 anos juraram dar prioridade a esse setor.

Ao final de seus mandatos, porém, o balanço tem sido medíocre ou, quase sempre, negativo. Que aconteceu, por exemplo, com a escola pública brasileira?

Em contraposição, há opiniões surpreendentes sobre a inutilidade do preparo cultural dos homens públicos.

Ouvi outro dia o ex-ministro Delfim Netto dizer na rádio CBN esta coisa estapafúrdia: “Confio em Lula. Até porque ele não tem curso universitário. Mas tem intuição”.

Para esse professor universitário, ter curso superior é uma espécie de obstáculo aos governantes.

Ozires Silva considera 'muito triste' a situação brasileira no campo educacional:

“O Brasil está relacionado nos últimos lugares na comparação com outros países. Segundo estatísticas publicadas pelo Ministério da Fazenda do Brasil, do total arrecadado em impostos pelo governo federal - no período de janeiro de 2003 até setembro de 2006, a União gastou em educação apenas 1,29%. Se tomarmos apenas um exemplo, o da Coréia do Sul, comprova-se que os coreanos não apenas investem bem mais em educação do que o Brasil, como também continuam a fazer uso mais eficiente do dinheiro, conseguindo resultados escolares e econômicos excepcionais. Não é por acaso que os produtos coreanos estão cada vez mais presentes nos mercados internos do mundo e no Brasil”.

Nem o exemplo de cinco países, entre tantos que fizeram a revolução da educação nos últimos 50 anos – Japão, Coréia do Sul, China, Taiwan e Irlanda – tem servido para convencer o Brasil a seguir o mesmo caminho.

Quando teremos um governo capaz de dar à educação a prioridade que ela merece?
(O Estado de SP, 10/12) 


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